sábado, 8 de outubro de 2011

A Dimensão Espiritual do Meio Ambiente
Nas duas últimas décadas, o movimento ambientalista foi o grande responsável por trazer à tona o tema “meio-ambiente”, colocando-o no cenário mundial de discussão, fazendo a necessidade de preservar a natureza um anseio da população planetária.
São crianças, jovens e idosos, de todos os credos, raças e nacionalidades que, se indagadas pela premência de cuidar do meio ambiente, respondem afirmativamente conscientes de que, se não for cuidado, suas vidas também estarão ameaçadas.
É cada vez mais freqüente a manifestação de grupos a favor da preservação da água, do ar, da terra, como também é freqüente, a luta por uma vida mais saudável, associada ao sentido de “natural”.
Entretanto, nos intriga saber, porque, apesar de tamanha pressão dos ambientalistas, ainda os países, principalmente do Primeiro Mundo, continuam gastando energia e recursos naturais em prol de um processo de desenvolvimento centrado na primazia do econômico, dirigido pela tecnocracia, onde as condições de produção ainda prevalecem sobre as da dignidade do homem?
Para Pe. Josafá C. Siqueira “temos que promover uma revisão de nosso estilo pessoal e social de vida... Somente uma base teórica e prática da ética ambiental é que possibilitaria desenvolver novas relações concretas entre a natureza, o indivíduo e a sociedade.... É necessário criar, reaproveitar e readaptar novos padrões de consumo, libertando-nos dos que são ambientalmente danosos ao espaço sócio-ambiental”...
Mudanças radicais nas diversas dimensões do espaço ambiental já ocorrem, tanto na biológica, quanto social, cultural e econômica, entretanto de forma isolada, fragmentado. A diversidade apesar de rica e abundante, não se faz plena, por ausência de unidade, de sentido.
O resgate do sentido, do significado, reside na dimensão espiritual do meio-ambiente. É através da dimensão espiritual que se dá a integração do particular com o universal.
Afirmam Dorothy e Walter Schwarz: “A sobrevivência humana impõe uma consciência mais profunda do meio ambiente natural”... A consciência tem que ser espiritual, do contrário ainda estaria em questão um produto quantificável, chamado meio-ambiente, que é um segmento da vida, não a vida em si”....
O espiritual a que os autores se referem, “não se identifica com qualquer religião nem se limita ao crescimento religioso, abrange o intuitivo, o que escapa a medida, o estético, abrange a solicitude do amor”
Mesmo que nossa racionalidade nos permita tornar umas das dimensões do meio-ambiente como objeto de estudo, estaríamos equivocados se perdêssemos o sentido de a ele pertencer.
O sentido de pertencer nos faz conscientes de que não há distanciamento entre o nós e a natureza. A natureza somos nós, vivemos em comunhão com ela, por isto a amamos.
Neste sentido não basta cuidar, preservar, regenerar o meio-ambiente é necessário e, é fundamental viver em comunhão com ele e amá-lo.
Compartilhar com o meio-ambiente da nossa parte mais profunda e verdadeira, advinda do coração, toca algo que as palavras podem apontar, porém jamais expressam, pois aí reside a dimensão da espiritualidade.
Estas constantes viagens ao desconhecido, são aventuras do espírito, presentes no ciclo eterno vida-morte-renascimento.
Tal como no Ciclo da Páscoa, em que Jesus crucificado morre para ressuscitar, no ciclo da natureza, é necessário que a semente morra para dar vida à planta. Acreditamos que o planeta para sobreviver, solicita um projeto de resgate da dimensão espiritual do meio-ambiente.
Este projeto requer que as instituições e pessoas se organizem, considerando as necessidades espirituais e materiais. Isto não significa abolir a tecnologia mais subordiná-la, redescobrindo a função social própria do espiritual.
PORQUE UMA DIMENSÃO ESPIRITUAL NAS ESPERE
É importante esclarecer o que se entende hoje em dia por espiritualidade, sobretudo na perspectiva de trabalho com a comunidade e mais especificamente, com as organizações comunitárias de base.
A dimensão espiritual foi definida como o esforço intencional das organizações comunitária de base para recuperar e fortalecer os valores da convivência e a apropriação do espaço público como sagrado, com o fim de dinamizar os projetos de vida dos indivíduos e das comunidades. Por isso, faz-se necessário explicar o significado do espiritual.
“Espiritualidade” é uma palavra que teve um uso infeliz. Pra muitos, espiritualidade indica algo distante da vida real, inútil, cansativo e até talvez odioso. Assim pensam aqueles pessoas que legitimamente querem fugir de velhos e novos espiritualismos, e finalmente, de tudo aquilo que parecer ser contrário à vida real.
A palavra espiritualidade deriva de “espírito”. Na mentalidade mais comum, espírito se opõe à matéria. Os “espíritos” são seres não materiais, sem corpo, muito diferentes de nós. Nesse sentido, é espiritual o que não é material, o que não tem corpo. Diz-se de uma pessoa que é “espiritual” ou “muito espiritual” se ele vive em outro muito, sem se preocupar com o material, nem sequer com o seu próprio corpo e com o seu grupo social.
Estes conceitos limitados de espírito e espiritualidade como realidades opostas ao material e ao corporal provêm da cultura grega. Dela, passou-se à latina e daí à espanhola e a todas as demais línguas latinas e germânicas. Quase tudo que se pode chamar de “cultura ocidental” está contaminado deste conceito grego de espiritual. O mesmo não acontece, por exemplo, em nossas línguas indígenas autóctones, como o Paez, o Huitoto, o Coreguaje e tantas outras.
Tampouco no idioma ancestral da Bíblia, a língua hebraica, o mundo cultural semita entende dessa forma o espiritual. Para a Bíblia, o espírito não se opõe à matéria e nem ao corpo, e sim à maldade (destruição); opõe-se à carne, à morte (à fragilidade do que está destinado à morte); e opõe-se à lei (à imposição, ao medo, ao castigo)[1] Neste contexto semântico, espírito significa vida, construção, força, ação, liberdade. O espírito não é algo que está fora da matéria, fora do corpo ou fora da realidade; pelo contrário, é algo que está dentro, que habita a matéria e lha dá a vida; e enche de força, a move, a impulsiona, a lança ao crescimento e à criatividade com ímpeto de liberdade.
Em hebreu, a palavra espírito, ruah, significa vento, sopro, hálito. O espírito é como o vento, ligeiro, potente, intenso, imprevisível. É como o sopro, o vento corporal que faz com que a pessoa respire e se oxigene, que possa seguir raiva. É como o hálito da respiração; quem respira está vivo; quem não respira está morto.
O espírito não é outra vida senão o melhor da vida, o que a faz ser o que é, suprindo-a de qualidade e vigor, sustentando-a e impulsionando-a. Diremos então que algo é espiritual pela presença do espírito que tenha dentro de si.
O espírito como paixão e fogo
A partir do até aqui exposto, podemos aprofundar alguns conceitos. O espírito de uma pessoa é a parte mais profunda de seu próprio ser: suas “motivações” últimas, seu ideal, seu sonho, sua paixão, a mística pela qual vive e luta e com a qual contagia os demais. Dizemos, por exemplo, que uma pessoa “tem um bom espírito” quando é de bom coração, de boas intenções, com objetivos nobres, com veracidade. Dizemos que “tem um mau espírito” quando nela habitam más intenções, ou é dominada por paixões baixas ou quando algo nela nos faz sentir a desconfiança e a falsidade.
Diz-se também que uma pessoa “tem muito espírito” quando nela nota-se a presença e a força de motivações profundas, de uma paixão que a conduz, de um fogo que a coloca em ebulição, ou de uma riqueza interior que a faz transbordar. E dizemos, em caso contrário, que “não tem espírito” quando é vista sem ânimo, sem paixão, sem ideais; quando fecha-se em uma vida vazia e sem perspectivas. Mais de uma vez, utilizaremos em vez de espírito ou espiritualidade, certos sinônimos relativos (sentido, consciência, inspiração, vontade profunda, domínio de si, valores que guiam, utopia ou causa pelas quais se luta, caráter vital), para manter afastado ou restringido o conceito grego que lamentavelmente vem à nossa mente, uma vez ou outra.
O espírito (a espiritualidade) de um pessoa, comunidade ou moradores, é então um conceito muito mais amplo. Resumindo, é a motivação da vida, o caráter, a inspiração em qualquer atividade, as utopias e sonhos que as pessoas têm e as instituições. Não basta então que se alcance o desenvolvimento material e físico em um Bairro. Uma boa Organização comunitária de base se preocupa por fazer desenvolver este capital social na comunidade. Sem este capital social, a comunidade não pode realmente progredir.
A espiritualidade, patrimônio de todos os seres humanos
Toda pessoa está animada por um ou outro espírito, está marcada por uma ou outra espiritualidade, porque a pessoa é um ser fundamentalmente espiritual. Esta afirmação pode ser entendida e explicada de formas diversas, segundo as distintas crenças ou correntes antropológicas, filosóficas e religiosas.
Essa profundidade pessoal[2] (o fundamento, na linguagem dos místicos clássicos) vai sendo forjada pelas motivações que fazem a pessoa vibrar, pela utopia que a move e anima, pela compreensão da vida que essa pessoa vem construindo através da experiência pessoal, na convivência com seus semelhantes e com os outros seres, nas mística que essa pessoa define como base de sua definição individual e de sua orientação histórica.
Quanto mais conscientemente vive e age uma pessoa, quanto mais cultiva seus valores, seu ideal, sua mística, suas opções profundas, sua utopia, mais espiritualidade tem, mais profundo e mais rico é o seu interior.
A espiritualidade não é patrimônio exclusivo de pessoas especiais, profissionalmente religiosas, ou santos, nem sequer é privativa das pessoas que crêem. A espiritualidade é patrimônio de todos os seres humanos. Mais ainda: A espiritualidade é também uma realidade comunitária; é como a consciência e a motivação de um grupo, de uma comunidade. Cada comunidade tem sua cultura e cada cultura tem a sua espiritualidade.
Conclusão
Esta forma de ver a espiritualidade como entusiasmo interior e como motivações últimas de vida é a que permite se integrar dentre de um programa de desenvolvimento na cidade com motivações naturalmente civis. O objetivo definido pela dimensão espiritual do programa ESPERE busca contribuir para que os indivíduos e as organizações de bairros cultivem um capital espiritual e fortaleçam sua idéia de futuro, a visão de cidade e o entusiasmo para construir convivência e paz.
Neste esforço de convivência, os temas do Perdão e da Reconciliação têm um papel central e indispensável. Através do Perdão e da Reconciliação, as pessoas e as comunidades recuperam o espírito e a espiritualidade.

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